sexta-feira, 13 de maio de 2011

Katharine Hepburn

"Katharine Hepburn foi a melhor e mais
importante actriz da história do cinema"
(João Bénard da Costa)

Katharine Hepburn. New York, 1938. Alfred Eisenstaedt.


Que o actor (todo o grande actor) esteja em «estado geral de graça», já Herberto Helder o disse num poema belíssimo. Mas, para continuar a citá-lo há o «actor (que) acende a boca» / (que) «acende os pés e as mão» (que) «estala como sal queimado» e o actor (a criatura do cinema, para dizer melhor) a quem acendem a boca, os pés e as mãos e que só depois dessa luz acesa (por outro - o realizador) estala também como sal queimado. os primeiros «transformam a própria acção da transformação». Os segundos são «transformados por essa acção».
(...) Katharine Hepburn que «cresce no seu acto», que «faz crescer o acto» precisa e não precisa que a acendam. Vê-la em filmes é ver uma grande actriz num teatro filmado, sem qualquer sentido perjorativo. também nunca a vi em carne e osso, mas aposto que a experiência não é diferente e que o que ela consegue perante as câmaras consegue nos palcos. Aqui o que a câmara revela é a actriz, não a mulher, é a representação não a aparência, é a «astronave que atravessa a distância de Deus» não a deusa que atravessa a distância da astronave. 



Katharine Hepburn. New York, 1938. Alfred Eisenstaedt.


Mesmo os maiores cineastas que a dirigiram (Cukor, Hawks, Mankiewicz) e dirigiram pelo acender da boca (a magia do seu verbo) e revelaram como ser teatral (mais uma vez, no melhor sentido da palavra), a gravaram e não a criaram. Antes de ser estrela, é actriz; depois de o ser também. Não sei explicar melhor, mas sei que é esta  a direção misteriosa que explica a diferença entre Hepburn e Marlene, entre Hepburn e Marilyn, entre Hepburn e Garbo. É uma mudança de estado, no sentido em que fala da passagem do estado sólido a liquído ou gasoso. Hepburn passa por eles todos, as estrelas jamais têm acesso ao sólido. O instante é a sua natureza (a 24 imagens por segundo) e não as horas, os dias ou as noites, natureza das outras. (...) Nasceu em Hartford, Connecticut e estudou na Bryn Mawr University donde lhe viria o peculiar sotaque, tão inconfundível. Começa no teatro e já está na Broadway em 1928. O sucesso de uma adaptação de «Lisistrata» leva a RKO a contratá-la em 32. Por sorte foi parar às mãosde Cukor que a dirigiu pela primeira vez em a Bill of Divorcement. No ano seguinte em Morning Glory (Lowell Sherman) ganha o seu primeiro «oscar», triunfo espectacular para uma jovem de 24 anos. Mas, do mesmo, é o admirável Little Women (de novo, Cukor) em que fez uma inesquecível Jo.


Katharine Hepburn.

Após três filmes menores, tem em 35 outro ano áureo: Sylvia Scarlett, que persisto em considerar o seu máximo papel e onde contracenou pela primeira vez com Cary Grant; Alice Adams (George Stevens), Maria Stuart (John Ford) e A Woman Rebels (Mark Sandrich) título quase paradigmático para o seu personagem. Paradoxalmente, à època, nenhum desses filmes foi grande êxito, como o não foram os quatro seguintes: Quality Street (Stevens), Stage Door (La Cava), ambos de 37, Bringing Up Baby (Hawks, 38 - outro dos seus filmes mais geniais) e Holiday (38) de novo Cukor, e ambos com Cary Grant.
(...) Diz-se que foi Selznick quem mais se opôs à hipótese de ser ela a fazer a Scarlett O´Hara no E Tudo o Vento Levou. Hepburn rompe então com a RKO e Hollywood e regressa aos palcos para fazer «Philadelphia Story» que foi um êxito monumental. Quando quiseram adaptar a peça ao cinemas descobriram que Miss Hepburn tinha adquirido todos os direitos, com uma cláusula prevendo expressamente que qualquer adaptação cinematográfica só podia ser feita com ela e tendo ela o direito de escolher o realizador e «partenaires». A Metro teve que «engolir tudo: pagou-lhe 250 000 dólares e Hepburn escolheu Cukor, Cary Grant e James Stewart. Assim nasceu Philadelphia Story uma das melhores comédias jamais feitas em Hollywood. Injustamente preterida para o «oscar», atingiu então o máximo de celebridade.

João Bénard da Costa, em Dicionário, 
Catálogo do Cinema Americano dos Anos 50, 
Editado pela Fundação Gulbenkian, Lisboa 1981


Katharine Hepburn. New York, 1938. Alfred Eisenstaedt.


 Capa do catálogo do Cinema Americano dos Anos 50.


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